31 de out. de 2010

Devaneio 1

Hoje derrubei uma casquinha de sorvete na rua.
Quem limpava a rua já estava estressado e brigou com o chefe por ter que limpar a rua em frente à loja dele. O chefe ficou com raiva, e não deu a ele as férias no tempo que havia prometido. Então o varredor teve que limpar por mais duas semanas a calçada dali. Sorte pra uma menina que passava uma semana depois da minha casquinha ter caído, porque ela deixou de escorregar no óleo que um mecânico derramara no dia anterior, e o varredor limpara. A menina não caiu e pôde ir pra aula sem se atrasar. Ainda bem, porque ela tinha um teste surpresa naquele dia e não passaria de ano se não o fizesse. Ao chegar em casa, ela contou que fizera o teste e passaria de ano. O pai planejou a viagem de férias e a mãe cozinhou naquele dia. Pena que era camarão e o irmão mais novo tinha alergia, sem saber. Foram parar no hospital e ficou tudo bem. Ainda bem que ele descobrira em casa a alergia. Se viajasse ia comer camarão num lugar isolado e não conseguiria encontrar ajuda. O médico de plantão voltou para a sua casa mais tarde por causa do menino e evitou bater o carro num lugar onde bateria se tivesse saído 10 minutos mais cedo. Por ele ter saído mais tarde, o médico que o substituiria teve mais 10 minutos de sono. Isso evitou que ele errasse o diagnóstico de uma menina que chegara. Ela era filha da moça que me vendeu a casquinha. Se eu não tivesse comprado um sorvete, ela não teria dinheiro para levar a filha ao hospital. Ninguém pode dizer que a minha casquinha não é importante. Ou que eu não sou importante. Ou que qualquer coisa nessa vida não é importante. Se a filha dela não tivesse sido diagnosticada corretamente, ela deixaria de vender sorvete. E eu não poderia imaginar, hoje, tudo o que a minha casquinha no chão pode ter causado ao mundo.

25 de out. de 2010

Domingo

Daqui dava pra ver a janela dele.
Ele de costas, sentado no sofá. E uma TV pequena ligada, chiando bastante.
Era meio calvo e chovia um pouco. Começava a escurecer.
E enquanto os comerciais chegavam eu pensava que nunca havia visto alguém mais sozinho.

6 de out. de 2010

Para um amigo

Ainda há um sofá pra você em San Tropez...