30 de jun. de 2009

Intocável

O céu me disse
Pra não pensar que sou demais
Pra não achar que podem tudo
Pra olhar pra cima
Ele me disse pra curtir a chuva
E aproveitar o sol
Que o céu deixa tudo mais bonito
Só pra mim, só pra mim
Ele queria mesmo era que eu visse
O que existe além da minha visão
Me pediu pra curtir
Tudo o que eu puder
Que o sol e a chuva
O dia e a noite
Estão aí pra mostrar
Que sempre há esperança, um dia após o outro
A vida é eterna até quando não é
Agora me diz, céu
Por que fica tão longe?

24 de jun. de 2009

Nada

E tudo que a gente faz não vale nada
Toda dor é esquecida
Toda alegria passa
Somos empurrados pela vida
Pra fazer o que nem queremos
Em prol de um bem maior
Que ninguém conhece
Traçamos dia após dia
A eterna linha da humanidade
Não se pode quebrar o ciclo
Não há como decepcionar os demais
Somos escravos da própria vida
Vida minha, não dá
Me empurra mais um pouquinho
Me puxa de volta pra linha
Cansei de não valer nem ser
Sou menos que nada e nada mais
Não acredito mais no bem maior
Se não sei o que é bem
Nem o que é maior
É melhor me fazer fazer tudo mesmo
Talvez assim eu veja
Alguma coerência no que faço
Alguma razão no que vejo
Talvez assim eu tenha
Um plano espetacular para mostrar
Uma pessoa para amar
Uma vida para viver
Uma vontade de continuar

23 de jun. de 2009

Pietro

Meu amigo acorda cansado
Passa o dia todo ouvindo
Sem poder falar
Ele fica ali, sentado
Não pode levantar
Deve prestar atenção
Deve fazer menção
A qualquer comentário
Ele chega à exaustão
De ouvir sem ser ouvido
Seus comentários são inúteis
Só servem pra fazer volume
Nessa educação de massa
E quem quiser passa
Nessa pequena estúpida jornada
Meu amigo se deita tarde
Deve acordar cedo
Pra fazer o que não pediu
Levar a vida que não vive
Pra ser alguém que não quis ser
Ele, amigo, dorme exausto
Acorda cansado
De ser empurrado
À eliminação de si mesmo
Meu amigo está cansado
Do mundo.

21 de jun. de 2009

Uma Carta

Viva a sonhar
Porque os sonhos são seus, só seus
Não ligue se te disserem que não presta
Que se veste mal
Que nunca vai ser bom o suficiente
As pessoas tendem mesmo a rejeitar
Tudo o que é bom demais
Tudo o que incomoda demais...
Viva no seu mundo
Colorido ou em preto e branco
Colora ele do jeito que quiser
Não ligue para erros
De ortografia ou de ações
Erros só são erros se você tiver medo de errar
Algumas coisas parecem tão grandes
E depois de um tempo ficam tão pequenas
Não ligue para coisa alguma
Não perca tempo
O tempo é vilão
Passa rápido e não deixa rastro
O tempo é seu, não dos outros.
Faça o que te agrada
Agrade a quem você gosta
E um dia
Quem sabe um dia
Possa ser feliz
Seja feliz.

19 de jun. de 2009

Sem pontuação certa e do meu jeito

Estafa
Do mundo.
Inspiração não chega, criatividade não existe.
Estou presa aos meus próprios padrões, não consigo sair dessa escrita...
Os versos me prendem cada vez mais, sou escrava da língua.
Se da minha língua nada sai, das palavras escritas elas jorram.
Jorram sem motivo, jorram e me surpreendem
Descubro-me e redescubro-me nas palavras.
Saio do papel, me desdobro em mil...
Talvez eu não seja o que escrevo
Talvez eu seja tudo o que eu escrevo
Não há certeza na escrita
Não há interpretação que te limite
Autor é personagem, personagem autor é.
Leitor torna-se personagem, se vê em cada história
Se não é personagem, não gosta da anedota
Egocentrismo literário
Inspiração chegou, mas a criatividade não
Não há novidade na minha escrita, sempre nos padrões
Palavras avulsas surgem, sequer fazem sentido juntas
Não me vejo no que escrevo
Ninguém se vê no que escrevo
Sou autora-fantasma, com leitores imaginários.
Egocentrismo vazio

14 de jun. de 2009

Romance

Era noite cá e dia lá.
Ela gostava de sentir o cheiro da chuva, ele gostava de se molhar.
Enquanto ele dormia, ela acordava.
Eles sempre estavam naquela sincronizada assincronia
Todos os dias ela dormia pensando nele
Todas as manhãs ele acordava imaginando ela
Andavam supondo como o outro andava
Amavam pensando como o outro amaria
Quando ela sentia dor, ele se lembrava dela
Quando ele ficava feliz, um surto de felicidade surgia nela
Eles estavam conectados
Além de fusos horários e falta de religião
Mais que uma palavra ou um diálogo inteiro
Eram parte um do outro, como o dia é pra noite
Eles queriam estar juntos
Mas nunca é noite e dia no mesmo lugar
Ela dorme e ele acorda
E sequer existem

12 de jun. de 2009

Televisão

Todos tentam controlar
A hora de acordar, a hora de dormir
Quando sair, quando chegar
Quem ter ou não ter
A vida dos outros e a própria
Mas o mais incrível é que não há controle!
Não sabemos se vamos acordar ou poder dormir
Não prevemos se poderemos sair ou chegar
Ninguém pertence a ninguém
Vida nossa e de todo o mundo
É emaranhado imprevisível
Filme sem final, música sem início
Todos tentam controlar
O próprio controle pela vida
Mas é carro desgovernado
Água em peneira
A vida vem e vai, pega e leva
Não é minha nem sua
Não adianta tentar controlar
Aquilo que controla a nós
Vida é controle-remoto
Do preguiçoso destino meu
Muda, canal, muda!
Nem isso posso mudar
O controle foge à minha posse
Vida é incomparável, livre
Liberdade minha

11 de jun. de 2009

Sobre

Mudo muda.
Não quero que ninguém saiba o que sinto.
Ajeito a mobília, sento-me no sofá empoeirado.
Choro baixinho, discretamente.
Queria tanto mudar o mundo!
E não mudo nem meu modo de me mudar.
Enxugo as lágrimas calmamente. Gosto de senti-las descendo pelo meu rosto, quentes.
Mudo tudo de lugar novamente.
Meu mundo é meu modo de mudar.
Se mudo algo de lugar, sinto esvaziar a mente.
Queria tanto me esvaziar...
Jogar fora os pensamentos, cuspir as palavras.
Cansei de ser muda, de mudar sem mudar e de ter um modo tão estranho de ser e estar.
Ajeito a cortina, perfeitamente.
É como se tirasse mais um peso das costas.
Puxo o tapete rapidamente, sinto alívio no meu estômago, sempre retorcendo de dor.
Termino tudo. E não terminei nada. Sinto o estômago retorcer, a cabeça arder, as costas doerem. As lágrimas ressurgem. Mas dessa vez, sequer as enxugo.
Sento-me no meu tapete arrumado, arranho minhas pernas. Algo ali tem que fugir da perfeição... Algo tem que ser errado, diferente. Esse algo sou eu. Atrapalho a sincronia perfeita da minha própria vida.
Bagunço os cabelos e vou até o espelho mais próximo. Vejo o caos nos meus olhos, reflexo da mente.
Minha pele está vermelha e molhada. Entro no banheiro organizado, lavo o rosto. Gosto de sentir a água gelada na minha pele quente.
Deito-me no chão de lá. Não gosto de sentir frio naquele azulejo. Castigo-me. Minha pele aquece o piso. Sinto-me confortável.
Gosto de sentir a mudança após a crise.

8 de jun. de 2009

A Menina que Criou a Terra

Ela vivia sempre trancafiada. Era filha dos Deuses, dona da Verdade Eterna. Tinha aqueles olhos tristes, sempre se destacando, não importava onde. Seus cabelos eram tão longos que podiam tocar o chão e o céu, o céu e o inferno. E tocavam.
Não podia deixar o castelo, não podia falar com ninguém exceto os moradores de lá, que eram apenas escravos. Ela se sentia uma escrava também.
Um dia um dos escravos deixou-lhe um presente em segredo. Chamava-se Terra. Era como uma casa de bonecas que ela podia controlar. Ele a disse que poderia fazer qualquer coisa ali. Habitantes, paisagens, animais, comida. Era apenas pintar e jogar o papel dentro da esfera que era a Terra. Seria o segredo deles. Ninguém poderia saber de sua existência.
A Terra tinha uma abertura para os papéis e uma lupa mágica, que deixava a menina ver cada cantinho do lugar. A menina, então, se tornou a guardadora da Terra. Criou animais e pessoas, lugares e mares inacreditáveis. Quis fazer o melhor para os seus habitantes. Criou pequenas árvores que davam frutos e fez o vento para refrescá-los do sol que fizera para aquecê-los.
A cada dia a menina fazia pinturas diferentes para o que ela chamou de céu. Ela queria que as pessoinhas fossem mais felizes que ela. Fazia pinturas tão lindas, tão delicadas e profundas, para que as pessoas pudessem ver que havia alguém cuidando delas ali. E elas não viam.
A menina via pessoas chorando, matando, roubando. Não entendia. O que fizera de errado? Passou a fazer mais coisas para alegrá-las, então.
Criou as cachoeiras, as nuvens, os sabores. Decidiu que tudo precisava de um sabor, um cheiro e uma cor. Deixou tudo mais doce, mais cheiroso e colorido, mas as pessoas continuavam infelizes!
Para se sentir feliz, ela precisava deixar as suas pessoas felizes. Um dia chorou pela primeira vez, e na Terra fez chover. Ela resolveu olhar pela lupa de novo. Viu crianças correndo na chuva, casais se beijando, as plantinhas crescendo. A menina então percebeu que o que faz a felicidade é a infelicidade. Só assim cada um valoriza o que tem.
Ela guardou a lupa e se deitou na caminha estreita. Ela era infeliz por estar presa, mas era a pessoa mais feliz por ter a Terra. Naquele dia criou o arco-íris.
O arco-íris era a mágoa que foi embora, a lágrima que foi secada, a briga que terminara. Coloriu o arco-íris com todas as suas cores favoritas.
Guardou a Terra que era seu tesouro e desejou que todos tivessem um tesouro como ela tinha. Antes que pudesse criar esse tesouro para todos, percebeu que eles já o tinham. Era um abraço, um beijo, um coração. Era ser aquecido por algo mais que o sol. Era ter algo que fizesse a mágoa ir embora e o arco-íris reaparecer. Eles tinham uns aos outros, e ela tinha a eles. Era mais que um tesouro.

6 de jun. de 2009

A Arte de Ganhar em Último

Tento e falho, desisto e perco.
Tentativa boba, tentativa insossa.
Tentar é perder, não tentar não é ganhar.
Finjo que tento, finge que acredita.
Tentativa ilusória...
Tento te enganar, tenta me acreditar.
Tentativa monótona.
Tento sem tentar, falho sem falhar.
Perco sem tentar.
Tentativa desperdiçada.
Cansei de tentar tentar...
Tentativas falsas!
Se tento é por tentar.
Tentativas inúteis.
Desperdicei tentando!
Prefiro não tentar.Fazer o que se gosto só de ganhar...

5 de jun. de 2009

Janela

Abre e fecha
Tudo.
Abro e fecho meus olhos.
Abro e fecho. Minha mente, meus deveres, meu dia.
Abro e fecho. Minhas lembranças e meus temores.
Fecho e abro. Meu coração, minhas dúvidas, meus remorsos.
Abro para o amor, fecho para a razão. Fecho para a razão e não abro para o amor.
Endurece-me a alma, amar. Fecha-me a alma. De que adianta abrir o coração e fechá-la?
Fecho o coração, abro a alma. Deixo tudo livre, exceto o mais importante.
Abro para alguém, fecho para alguéns. Direitos livres: fecho para todos.
Fecho a cara, fecho os olhos, fecho a mim mesma.
Enclausurada numa concha. Abro uma fenda.
Abro e vejo a mim, fecho e enxergo a mim.
Abre e fecha.
Tudo.
Abro e fecho meus livros;
Abro e fecho meus textos;
Abro e fecho minha vida
Uma vez só.